Seguro DPVAT: A Rede de Proteção Mínima e a Luta de uma Advogada por Justiça

 

Motivos para Escolher a BH Proteção Veicular em 2025

Da Frieza da Lei à Realidade Crua das Vítimas: O que o DPVAT Realmente Significa

 

 

Um Guia Prático e um Alerta: Como Acionar e Por Que Você Jamais Deve Contar Apenas com Ele

 

Tem dias que meu escritório parece um arquivo de vidas interrompidas. Pastas e mais pastas com histórias de perdas, disputas e, às vezes, de pequenas vitórias que têm um sabor imenso. Hoje, uma dessas pastas está sobre minha mesa. A etiqueta, escrita com minha própria letra, diz: “João C. vs. Seguradora Líder – DPVAT”. Só de olhar para ela, sinto o peso daquele caso, o cheiro de antisséptico dos laudos médicos e a lembrança da voz embargada de um rapaz que só queria o que era seu por direito. É impossível trabalhar com isso e não pensar no seguro DPVAT, essa entidade quase mítica que todo brasileiro que tem um carro ou moto paga, mas que poucos, pouquíssimos, realmente compreendem em sua essência e, principalmente, em suas cruéis limitações.

Muitos clientes chegam aqui achando que o seguro DPVAT é um seguro completo. É o primeiro e mais perigoso dos equívocos. Como advogada, meu primeiro passo é sempre desconstruir essa ideia. O DPVAT, que recentemente passou por uma transição e hoje é administrado pela Caixa Econômica Federal sob a nova sigla SPVAT, nunca foi pensado para ser um seguro patrimonial. Ele não está nem aí para a lataria do seu carro, para o para-choque que amassou ou para o farol que quebrou. A natureza dele é estritamente social. É um pacto mínimo de civilidade que nós, como sociedade, firmamos para garantir que nenhuma vítima de acidente de trânsito fique completamente desamparada, independentemente de quem seja o culpado. Ele cobre três coisas, e apenas três: despesas médicas e suplementares (o famoso DAMS), casos de invalidez permanente e, no cenário mais trágico, a morte. Os valores de indenização, historicamente baixos, são um reflexo de sua proposta: ser um socorro emergencial, não uma solução definitiva. É o cobertor curto que o Estado oferece para o frio cortante da tragédia.

A frieza da lei, no entanto, não prepara a gente para a realidade das vítimas. E foi o caso do João que cimentou essa verdade em mim. Ele era um motoboy, 22 anos, cheio de planos, usando sua moto para pagar a faculdade. Um carro o fechou num cruzamento. O motorista fugiu. João ficou com o corpo quebrado e uma sequela permanente na perna que o impediria de voltar a pilotar. Ele era a vítima perfeita do sistema: sem informações, sem recursos e com uma necessidade urgente da indenização do seguro DPVAT para o tratamento e para se manter. Ele tentou dar entrada sozinho. E aí começou seu calvário. A seguradora, na época, alegava que a lesão dele não era “permanente”, oferecendo apenas o reembolso de algumas despesas médicas, um valor irrisório. Cada negativa era um soco no estômago de um rapaz que já estava no chão. O cheiro de mofo da pequena sala de espera do IML, onde ele passou horas para conseguir os laudos, a textura áspera dos formulários que ele não entendia, o som do telefone que nunca trazia boas notícias… Era a burocracia em sua forma mais perversa, moendo a dignidade de quem já tinha perdido a saúde.

Quando o João chegou ao meu escritório, trazido pela mãe, uma senhora com as mãos calejadas de quem trabalhou a vida toda, ele estava prestes a desistir. Meu trabalho ali foi muito além de peticionar. Foi um trabalho de tradução e de acolhimento. Traduzir o “segurês” e o “juridiquês” para o português claro. Acolher a angústia e transformá-la em ação. Mergulhamos no caso. Juntamos cada receita de farmácia, cada nota de consulta, cada relatório de fisioterapia. A peça central da nossa batalha foi o laudo do Instituto Médico Legal, um documento denso, técnico, mas que era a prova irrefutável da sua invalidez. Entramos na justiça. Lembro do dia da audiência, do ar pesado do fórum, da minha argumentação focada em demonstrar não apenas a lesão, mas o projeto de vida que foi interrompido. A vitória, meses depois, com a determinação do pagamento integral da indenização por invalidez permanente, não teve o sabor de champanhe. Teve o sabor de justiça. Um gole de água no deserto. Foi a certeza de que aquele mecanismo, o seguro DPVAT, embora limitado, podia funcionar se forçado a isso.

Essa experiência com o João e tantos outros me tornou uma espécie de evangelista da informação sobre o DPVAT. E meu guia prático, que repito incansavelmente, nasce diretamente dessas trincheiras. Primeiro: documente absolutamente tudo. O Boletim de Ocorrência é o ponto de partida. Guarde-o como um tesouro. Crie uma pasta física ou digital e coloque ali cada receita, cada nota fiscal de medicamento, cada recibo de consulta ou sessão de fisioterapia. Você precisará deles para o reembolso do DAMS. Segundo: para casos de invalidez, o laudo do IML é o seu maior aliado. Não aceite uma avaliação superficial. A perícia precisa ser detalhada para que seu direito seja reconhecido na sua totalidade. Terceiro: Cuidado com os atravessadores. A solicitação do benefício pode e deve ser feita gratuitamente, hoje em dia pelo aplicativo da Caixa. Contudo, se o caso for complexo, se houver uma negativa ou se você se sentir perdido, não hesite em procurar um advogado de sua confiança. O que você gasta com honorários pode ser a diferença entre receber uma ninharia e obter o valor integral a que tem direito. E aqui vem o meu alerta mais veemente, o ponto que conecta tudo: jamais, em nenhuma hipótese, conte apenas com o seguro DPVAT. Ele é o seu direito mínimo, mas a sua proteção real, aquela que vai consertar seu carro, que vai pagar o conserto do carro de luxo que você bateu, que vai te dar um carro reserva para você continuar trabalhando… essa proteção tem outro nome: seguro facultativo. É o seguro que você escolhe, que você personaliza e que protege seu patrimônio. Confundir os dois é o erro mais caro que um motorista pode cometer.